segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Por favor, um pouco mais à esquerda.

Fernando Viana*


Começaram as eleições 2010. Os “homens públicos”, candidatos, começaram a aparecer na propaganda partidária obrigatória com aquele velho discurso. “__ Eu ajudei a fazer tudo que melhorou sua vida” É..., como disse um amigo de boteco, está chegando “o tempo da política.” Esse mesmo amigo, a quem me referia, disse que sempre votou na esquerda e agora se perguntava: Onde está a esquerda? Pergunta difícil de ser respondida em uma mesa de boteco, mas me esforcei, depois de duas, ou três cervejas, em encontrar a esquerda entre os copos e garrafas, diante do olhar atento na assembleia dos congressistas do butiquim.

Um grito no canto da mesa: Mas e o PT, não é esquerda?! A coisa se complicava a cada pergunta! Não vacilei em responder.

-O PT foi esquerda! Afinal de contas todos sabem que o PT é hoje o partido da ordem e que se sustenta no governo em aliança com os partidos de direita que sempre criticou, é claro que trata-se da posição que domina o PT hoje, pois ainda existem pessoas de esquerda no PT, mas com pouca expressão no partido.

Um outro sujeito jogou mais uma questão:

-Então quer dizer que para ser esquerda não pode estar no governo e é por isso que a esquerda nunca chegará ao governo no Brasil?

Vamos com calma, o que eu queria dizer, caro leitor, é que o PT implementa hoje as reformas dentro do Estado, reformas que ele sempre criticou. Por exemplo: O Lula, e o PT da década de 80 e início da década de 90, defendiam a redução da jornada de trabalho, sem redução de direitos. Isso se justificava, e ainda se justifica, na minha opinião, devido a possibilidade de aumentar os postos de trabalho e a qualidade de vida do trabalhador, já que com o avanço da tecnologia nós produzimos bem mais em menos tempo. Ou seja, ao invés de utilizar a tecnologia para demitir, poderíamos utilizá-la para diminuir o número de desempregados e melhorar a qualidade de vida dos que já estão empregados. Isso é possível! E era o que defendia o PT. Hoje, o PT no governo é outra coisa. O governo Lula aumentou nosso tempo de trabalho, aumentando a idade para a aposentadoria.

No Brasil, na atualidade, existem vários agrupamentos que dizem defender os direitos dos trabalhadores e se intitulam “esquerda”, são partidos que se definem como esquerda e acabam confundindo a cabeça da população. Além de definirem-se como esquerda, ainda alguns denominam-se socialistas, ou até mesmo comunista, como é o caso do PC do B. Estes partidos são base de sustentação do governo e não têm em seus programas uma estratégia socialista. Ao contrário, fazem o velho discurso do progresso e do desenvolvimento.

Falam em reformas que serão feitas na institucionalidade e que vão melhorar a vida da população. Nesta perspectiva, os movimentos sociais populares deixam de ser protagonistas e são chamados para dentro dos gabinetes. Um grande acordo para “crescer o bolo” Lembra dessa frase, caro leitor? É isso mesmo, esta era a frase do economista Delfim Neto, que esteve nos governos da ditadura militar no Brasil, é o mesmo que ajudou no plano econômico do governo Lula e agora vai ajudar na campanha da Dilma. O problema é que o bolo tá crescendo e nós continuamos esperando nosso pedaço.

Esquerda é um termo muito amplo e, historicamente, nunca existiu uma esquerda, sempre existiram vários agrupamentos no chamado campo da esquerda, aliás, desde a Revolução Francesa de 1789 as coisas são assim. Bom, mas isso é uma outra história. Fato é que, no conflito social, alguns agrupamentos agem conjuntamente em determinado momento para enfrentar um inimigo em comum, mas isso não significa que tenham o mesmo projeto.

Exemplo disso foi a resistência contra a ditadura militar no Brasil, comunistas, anarquistas, liberais, socialistas cristãos, tinha gente de todo tipo, que tinha uma coisa em comum, derrubar a ditadura dos militares. Algumas dessas pessoas foram parar em partidos de direita como o PSDB e o PMDB (no início era um movimento contra a ditadura). Ou ajudaram a organizar partidos de esquerda como o PT, que no início da década de oitenta falava em socialismo.

Falar nisso, estava revendo um vídeo da campanha de 1989, impressionante!! O Lula falando de reforma agrária, agitando um comício, diz que iria desapropriar as terras de todos os latifundiários, fosse terra produtiva ou improdutiva, porque nada justificava, segundo ele, tamanha concentração de terras nas mãos de poucas pessoas, enquanto os camponeses não tinham onde produzir sua sobrevivência. É... o Lula mudou muito, haja vista a reforma agrária que não aconteceu nem nas terras improdutivas! Basta comparar os índices do governo FHC e do atual Governo para perceber que no campo a coisa não mudou muito. Isso sem falar nas alianças do PT aqui em Goiás, de Íris a Alcides, todos são aliados do presidente Lula e todos são aliados dos latifundiários!

Vale a pena destacar ainda a votação que aconteceu na câmara municipal de Goiânia no final de Julho deste ano. Estava na pauta o projeto de lei para garantir um aumento salarial para os professores, por meio da regulamentação da “lei do piso”. Estava também em pauta um aumento de 25 para 30 por cento do orçamento do municio para educação. Os vereadores petistas votaram contra, contra os trabalhadores da educação e contra o aumento da verba para educação!!!

Bom, se o PT e os partidos de sua base de apoio ainda são esquerda, são de uma esquerda que se rendeu às alianças com a burguesia, acreditando ser possível o que eles chamam de “cidadania”, fazendo grandes acordos com banqueiros e multinacionais, e com os mais conservadores políticos da direita, reservando para o povo algumas medidas assistencialistas. Da minha parte, prefiro não defini-los mais como tal.

Mas e a esquerda, onde está? Um pouco mais a esquerda, hoje, no Brasil, estão as organizações políticas que não se renderam a mera via eleitoral, e que todos os dias fazem política independente das eleições, e sem a lógica da troca de favores. Militantes de esquerda são aqueles que contribuem para avançar a consciência política coletiva, na compreensão de que somos nós que produzimos toda a riqueza deste país, buscando a construção de um poder de fato popular. Em grupos de ação popular, nas comunidades, nos sindicatos e associações, a militância de esquerda é aquela que não se rendeu ao jogo de gabinete, que acredita em um projeto onde a classe trabalhadora organizada crie novas formas de poder. Essa esquerda existe, caro leitor, e está se reorganizando no país inteiro. O Partido Comunista Brasileiro se soma aos diversos lutadores sociais na reconstrução deste campo da esquerda, socialista e revolucionaria.

Meu amigo da mesa de boteco até entendeu o que eu estava dizendo e a maioria concordou com meus argumentos, mas não concordavam que o PT não fosse esquerda.Compreensível, já que muitos deles eram petistas desde criancinha. Da minha parte, se o PT e os partidos que dão sustentação ao governo Lula são esquerda...

-Com licença...

O garçom, descontente com o governo Lula, ironicamente pediu passagem;

- Por favor, um pouco mais à esquerda!



*Fernando Viana é historiador, coordenador do projeto Comunidade Fazarte, Membro candidato a Deputado Estadual e Secretário Político do Partido Comunista Brasileiro em Goiás.

Quem sou eu

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Luciano Alvarenga Montalvão, é graduando em Psicologia e servidor público. Coordenador Geral do Diretório Central dos Estudantes e representante discente no Conselho Universitário da UFG. Militante da União da Juventude Comunista, a Juventude do Partido Comunista Brasileiro.